Barefoot Gen | Autobiografia de um sobrevivente da Bomba Atómica

Gen Pés Descalços (はだしのゲン Hadashi no Gen?), é uma série de mangá criada por Keiji Nakazawa.

O mangá foi publicado em várias revistas, de 1973 a 1985. Posteriormente foi adaptado para três live actions dirigidos por Tengo Yamada, lançados entre 1976 e 1980. A Madhouse lançou dois filmes em formato anime baseados no mangá, um em 1983 e outro em 1986. Em 2007, uma adaptação para uma série de televisão foi produzida, transmitida nos dias 10 e 11 de agosto do mesmo ano.

A série começa no ano de 1945 em Hiroshima e arredores da cidade, onde um menino de seis anos, Gen, vivia com a sua família. Depois que Hiroshima é destruída pela bomba atómica, Gen e outros sobreviventes são obrigados a lidar com as consequências da destruição.

A história é baseada nas experiências do próprio autor, Nakazawa, já que ele próprio é um sobrevivente da bomba lançada em Hiroshima.

Sobre o Autor:

Keiji Nakazawa nasceu em Hiroshima, em 1939, e tinha 6 anos quando a cidade foi destruída pela bomba atômica. Perde toda a família, exceto a mãe. Em 1961 mudou-se para Tóquio e começou a trabalhar como quadrinista em publicações como Shonen Gaho e Shonen King. Em 1966, após a morte da mãe, passou a realizar histórias autobiográficas, inspirado nas suas memórias de infância e juventude. Entre esses trabalhos, destaca-se Gen Pés Descalços, a sua obra-prima e um dos mangás mais conhecidos no ocidente. Embora tenha ficado famoso pelos retratos de guerra pacifistas, o artista realizou histórias nos mais diversos géneros.

Impossibilitado de trabalhar devido a problemas de visão, Keiji Nakazawa reformou-se em 2009.

Comparando o filme à sua autobiografia, inúmeros contrastes emergem.

O próprio Nakazawa apontou um importante:

“O que defere a morte do meu pai de Barefoot Gen é que eu não estava no local. A minha contou-me sobre isso, com detalhes horríveis. Isso estava presente na minha cabeça enquanto trabalhava no mangá então decidi que Gen estivesse lá e tenta-se salvar o seu pai. A minha mãe sempre teve pesadelos sobre isso. Ela disse que era insuportável – ela ainda podia ouvir os gritos do meu irmão. Dizendo “vou morrer contigo”, ela agarrou o irmão nos seus braços, mas não importa como ela puxasse, ela não podia libertá-lo. Enquanto isso, o meu irmão disse: “Está quente!” e o meu também disse: “Faz alguma coisa!” A minha irmã mais velha Eiko, talvez porque estivesse presa entre as vigas, não disse nada. Na altura a minha mãe estava a chorar e a dizer: “Vou morrer com vocês”. Felizmente, um vizinho que passava disse-lhe: “Por favor, pare; não vale a pena. Não há necessidade de você morrer com eles. Pegou na mão dela e fez-la fugir do local. Quando ela voltou, as chamas ainda estavam ativas e ela podia ouvir claramente os gritos do meu irmão: “Mãe, está quente!” Era insuportável.

A presença de Gen num momento crucial em que Nakazawa Keiji estava ausente não é a única diferença. Para sustentar as mil e quinhentas páginas de Gen Pés Descalços, Nakazawa inventou subtramas. Um exemplo é a personagem Kondō Ryūta, que não aparece em nenhum lugar da autobiografia. Surpreendentemente, o livro trata Ryūta como uma pessoa real “Um órfão de Hiroshima, com cinco anos, adotado oficialmente na família de Keiji ‘Gen’ Nakazawa. Ele morava no mesmo bairro que o Dr. Hachiya. É como se um historiador do holocausto europeu tratasse um dos personagens de Maus de Art Spiegelman como uma pessoa real.

“Mãe, Gen e Ryuta”

Numa entrevista a Nakazawa  Keiji por Jonathan Clements, Nakazawa disse:

Eu escavei o meu pai, irmã e irmão das ruínas. Os seus crânios e outros ossos estavam intactos. Pensei que os humanos se tornassem assim quando fossem queimados. Quando o corpo da minha mãe foi cremado, havia poucos ossos. Isso fez-me tremer de raiva só de pensar que a radiação da bomba atómica privou a minha mãe, que havia sobrevivido por 21 anos, até dos seus ossos. Prometi nunca suportar guerras ou bombas atómicas “

Nakazawa regista vividamente como as comunidades se reunirão e dividirão durante a guerra e o seu rescaldo, e deixou um legado tão pungente e potente.

Começando nos meses finais que levaram ao bombardeamento de Hiroshima a 6 de Agosto de 1945, e terminando em 1953, “Gen Pés Descalços” leve-nos para dentro da guerra, do ponto de vista dos civis, sem nenhuma propaganda e com todo o potencial frágil da humanidade. Há discriminação e ganância, compaixão e sacrifício; pais bêbados que resistem à guerra e crianças traumatizadas que procuram crescer fortes “como o trigo”, enquanto pessoas de todas as nacionalidades lutam para sobreviver em condições horríveis – uma personagem memorável é um coreano amável, partilhando comida enquanto enfrentam preconceitos.

Exemplo disto é uma passagem do manga onde Gen questiona o pai:

Então, tudo que os professores nos ensinam sobre os americanos e os ingleses serem demónios é mentira?  Que o Japão é o país divino, que o imperador é Deus e que os ventos da justiça soprarão para dar a vitória aos japoneses também é?

O pai responde:

Tudo mentira! Neste momento as escolas, os jornais, as emissoras de rádio, a polícia e o exército desTE país estão todos A SER manipulados por essa corja de militares ditadores que iniciaram a guerra…e, por meio desses canais de comunicação, estão a ensinar mentiras a vocês, crianças.

E o que ratifica este diálogo é saber que a própria cúpula de guerra divulgava informações falsas pelo rádio e pelos jornais, para que o povo acreditasse na supremacia japonesa enquanto eles, os governantes e militares, discutiam internamente como incitar mais ainda a guerra.

Inclusive, um dos lemas japoneses era “Lutar até o último japonês”. E fica muito claro que toda a formação de estado com os cidadãos durante a guerra tinha como objetivo criar nos japoneses a ideia de abrir mão da vida com facilidade. O que gerou suicídios em massa e missões suicidas, como a dos pilotos kamikazes, frente de ataque que realizou mais de 290 missões com mais de 2.500 mortes.

Ou seja, existia então toda uma violência física e psicológica nessa população. Os próprios ataques e discriminações que a família Nakaoka sofre no decorrer do primeiro volume e do filme é com bases nessas ideologias de que quem não apoiasse ou acreditasse na vitória do Japão estava contra o imperador e era considerado antipatriota. E mesmo quando a população do Japão começa a demonstrar sinais de insatisfação com a guerra a autoridade militar e policial começa a autuar para obrigar que as pessoas continuassem a colaborar com a guerra.

Noutra parte do mangá o pai de Gen menciona um parente que voltou da guerra sem os olhos, braços e pernas e que foi recebido pela população como um Deus. Porém, essa pessoa estava a sofrer, a família era obrigada a ver o filho sofrer, eles ganhavam uma pequena contribuição do governo e ainda passavam por necessidades.

 

Review

A  arte é invulgar na medida em que adota uma abordagem mais “cartoonista” em comparação com outros animes, contudo o filme consegue atingir uma certa qualidade etérea que a manga não consegue igualar, especialmente na sua representação dos resultados da doença da radiação. A explosão atómica é feita com uma clareza chocante, e a transformação das pessoas em “monstros” (da perspetiva de Gen), é horrivelmente realizada.

O som é outra área em que o filme mostra a sua idade. Os efeitos, embora bem utilizados, podem por vezes ser esmagadores para o espectador, enquanto outras vezes os vários ruídos são relegados para segundo plano. Mas na maioria das vezes o som e o visual funcionam bem em conjunto.

A música é geralmente boa durante todo o filme. As várias peças utilizadas para aumentar o impacto de uma dada cena são geralmente apropriadas e bastante bem coreografadas, especialmente durante as cenas mais precursoras. O mais surpreendente são as cenas em que música, ruído e visuais se combinam para dar ao espectador uma experiência verdadeiramente visceral.

As personagens são um tema um pouco complicado, pois são geralmente tiradas das pessoas que Nakazawa conheceu antes, durante e depois do bombardeamento, enquanto o próprio Gen é Nakazawa quando criança.

Devido a isso a interacção de personagens são difíceis de considerar, especialmente dado o facto de se tratar principalmente de um relato factual e sendo assim, prefiro pensar nos personagens como “reais”.

Assistir este filme é uma experiência verdadeiramente angustiante. Não existe uma forma real de “apreciar” isto em termos normais, especialmente tendo em conta a sua história e conteúdo. Muito poucos filmes, especialmente os animados, são capazes de transmitir o nível de impacto emocional que o Gen Pés Descalços atinge. É extremamente difícil comparar qualquer outro anime ou manga a Gen Pés Descalços, pois nenhuma outra obra é tirada directamente da vida real.

Com toda a honestidade, o Gen Pés Descalços não, é algo para desfrutar, mesmo que termine com uma nota de esperança. Este é um filme a ser experienciado, pois, é a história de um rapaz que viu literalmente o inferno. É tanto uma lição como um aviso para as gerações futuras sobre o verdadeiro horror das armas nucleares e atómicas, e recomendo a todos, quer sejam fãs de anime e manga ou não, a lerem os livros e a verem o filme

 
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